terça-feira, 1 de março de 2011

Era um miúdo ...

Era um miúdo alegre, despreocupado,
talvez um pouco calado…
Mas corria no jardim entre os canteiros
e brincava com os amigos ao pião
e ao botão, dias inteiros.
Sonhava ser um dia aviador
pois vira certa noite os aviões
roncando no céu, a fugir,
perseguidos pela luz dos holofotes
que do jardim os atingiam,
mas não caíam…
Era a fingir.
E todos de nariz no ar,
fossem novos ou velhotes,
seguiam o espectáculo maravilhados,
embasbacados!
Ah! Ah! Ah!
..........
O professor era bom, muito bom,
ensinava coisas novas e bonitas,
embora por vezes ralhasse alto e bom som,
com razão,
pois o miúdo nem sempre decorava  
aquelas coisas esquisitas
mas que diziam serem boas para o futuro.
E a pergunta saltava:
“O que é o futuro, professor?”
Mais estudos? Não aturo
Tanto número, tanta letra,
tanto verbo, tanta treta…
Eu serei aviador!
Mesmo sem asas voarei pelo céu,
vou conhecer mundos, pessoas,
a todos darei coisas boas
quando tudo seja meu…
Assim pensava o miúdo
perna ao léu, calções pequenos,            
mas num instante cresceu
fez-se graúdo…
……….
E pouco mais estudou!
Porque o destino assim quis? Talvez…
Não quis ser monge
e passo a passo criou o seu caminho discreto,
concreto,
um degrau de cada vez…
Mas se nunca às guerras brincou
porque o mandaram para longe
defender não sabe o quê?
Se já não brincava, amava,
se já era homem, trabalhava,
pegar em armas? Porquê?
O futuro de que ouvira falar
quando era novo
só falava em estudar…e trabalhar,
Nem uma palavra, um aviso
de que havia uma terra, um povo
a defender, que obrigava a matar…
Mas tudo passou e nem sequer foi preciso
lutar.
……….
Sopraram ventos de mudança,
novas terras que se pisam,
nova gente que se abraça,
com esperança.
Novos rumos se divisam
num futuro que entrelaça
num amor que se encontrou
e durou.
Novos seres que aparecem:
Uma, duas,
Um, dois, três, quatro, uma alegria…
E os corações aquecem
e as almas enternecem
num milagre permanente.
E os anos vão passando
um a um, regularmente…
Passam muitos, muitos anos,
histórias, muitas histórias,
ansiedades, dificuldades
até alguns desenganos.
Conquistas, muitas vitórias
de trabalho, muito labor,
cantigas, choros e risos,
e muito amor.
Sorrisos,
como quem festeja
a vida, em música tocada alegremente
em vários pianos, profanos,
com muitas viagens, passeios
em oceanos de inveja.
……….
Por fim,
ao porvir um olhar descontraído
um pensar cuidadoso, maduro.
Na lembrança do passado e as voltas que o mundo deu,
um recolher decidido
com uma visão sossegada do futuro,
que ainda é meu.
Enfim!