Já em Novembro de 2013 me referi aqui à pouca credibilidade que me sugere a escolha das cartas à redacção que os jornais publicam, pois o exemplo que colho no jornal "Público" leva-me a pensar que essas cartas são escolhidas ou pelo nome do remetente ou pela força do protesto que demonstram...
Por curiosidade efectuei um apanhado das cartas publicadas no passado mês de Julho e verifiquei que das 61 cartas referidas na secção "Cartas à Directora" 22 delas se referem a apenas três autores, havendo ainda varios com 4, 3 e 2 cartas. Essas 61 cartas tiveram apenas 26 autores, quando devem ter sido centenas as cartas remetidas por leitores.
No passado dia 4 de Agosto remeti ao Provedor do Público a seguinte missiva:
"Permita-me senhor
Provedor uma pequena reflexão que me foi sugerida pela leitura da resposta
publicada na sua habitual coluna, no passado domingo dia 3 de Agosto corrente a
um leitor, e subordinada ao tema “Cartas à Directora”.
É uma secção que sempre me despertou
alguma curiosidade e que sempre leio com atenção e, por isso mesmo, tenho
notado quase sistematicamente dois factos:
1. Os autores das cartas publicadas são muito
frequentemente sempre os mesmos, já há alguns meses, e essa observação faço-a
pela memorização de alguns nomes tantas vezes lidos.
2. Tal facto levou-me até a desejar confirmar
se essa convicção era erro meu ou mesmo verdade… pelo que me dei à curiosa
tarefa de criar um pequeno mapa, que anexo, e se refere ao conjunto de “Cartas
à Directora” do findo mês de Julho.
Se tiver a gentileza de apreciar esse
anexo, verificará que em 61 registos de cartas recebidas nos 27 dias (ao
domingo não existe aquela secção):
- No mês de Julho
foram publicadas 61 cartas de leitores mas 22 dessas cartas pertencem a apenas
3 leitores;
- Essas 22 cartas
correspondem a 35% das cartas publicadas.
- Alguns outros
“leitores” são escolhidos 2, 3, 4 e 5 vezes… (Esclareço que não tenho nenhuma
carta enviada para publicação pelo que não serei “parte interessada” na
questão…).
Numa situação destas, não seria
oportuno considerar aqueles “leitores” em colaboradores eventuais dada a
regularidade da escolha dos seus escritos, e escolher outro local para a sua
inserção? Quantas centenas de cartas terão sido preteridas em favor desses
leitores escolhidos?
Porque será que a grande maioria das
considerações referidas nas cartas publicadas são sempre comentários negativos
e críticas cerradas a factos ou pessoas, como se tudo o que ocorre merecesse
sempre reprovação e nada haja a aplaudir ou incentivar? Será que a opção
editorial é a de apenas considerar “quem protesta”? Ou é essa mesma a linha da
direcção?
Há mais de vinte anos que sou leitor
diário do Público mas não posso deixar de registar que a linha editorial
frequentemente (muito…) se coloca quase sempre numa posição pouco pluralista e
muito virada para um só lado.
Aceite os meus cumprimentos"
Pois acabo de receber a seguinte resposta, que quero compartilhar com todos:
Prezado Leitor
Esta sua carta (email) é efectivamente
merecedora de grande atenção. Eu próprio sem ter efectuado a sua contabilidade
tinha há muito esta noção. Aliás, não sei se reparou, há dias referi-me ao
ssunto muito ligeiramente dizendo que há leitores que até enviam as mesmas
cartas para diferentes jornais. Existe, de facto, um grupo que «cultiva» esta
secção. Aliás, como acontece nos foruns de rádio ou televisão há um núcleo
muito «repetente». Aliás, como deve saber, houve creio que, em Maio, um encontro
entre leitores que normalmente escrevem cartas para os jornais e até enviaram
para os jornais um documento sobre o assunto. Esta questão levanta outras. Por
agora, escrevo-lhe por direito de resposta que tem, para agradecer-lhe os
dados, e é possível que volte ao assunto.
Cumprimentos
O provedor, J.M. Paquete de Oliveira
Este episódio trivial fez-me lembrar a teia de interesses em que todos estamos envolvidos, mesmo sem para isso contribuirmos conscientemente, nada parecendo normal ou espontâneo, sincero ou verdadeiro, mas apenas tudo se movendo em conformidade com os interesses ou intenções de terceiros, querendo moldar a nossa opinião com aquilo que melhor serve os seus interesses, económicos ou políticos.
Refere-se que a secção "Cartas à Directora" está aberta à opinião dos leitores, (mesmo que eticamente controlada), mas depois escolhem-se a dedo os "leitores" a os "temas" de acôrdo com aquilo que a direcção pensa... Qua pluralismo! Que abertura!